As trilhas são repletas de histórias de conexão, amizade, superação e alegria. Conhecemos muitas pessoas que ressignificam suas vidas a partir da prática de atividades em conexão com a natureza e as pessoas.
Mas nem todas as histórias são felizes, ou tem um final feliz. Essa é uma dessas histórias tristes, mas que deixam grandes lições a todos que temos a conexão com a natureza, o encantamento com a vida e a superação de limites como parte importante de nossas vidas.
Gabriel Buchman era um jovem idealista e empreendedor. Economista por formação, tinha o objetivo de estudar e trabalhar as políticas públicas para as comunidades mais pobres. Depois de terminar o seu mestrado, resolveu tirar um ano sabático. Passou a maior parte dele vivendo na África, mas não como um mero turista. Ele se entranhou nas comunidades em que viveu. Morou na casa das pessoas das comunidades, comeu sua comida, vestiu suas roupas, viveu como viviam. Apesar de ter recursos limitados, compartilhou e ajudou as pessoas que conheceu. Foi muito querido por onde passou. Também teve conflitos. Sem dúvida deixou uma marca nos lugares onde esteve.

Gabriel gostava de conquistar montanhas. No Brasil, subiu o Pico da Neblina, na França o Mont Blanc. Durante sua última viagem, conquistou o Kilimanjaro, ponto mais alto da África. O Monte Mulange, pico mais alto do Malaxi, foi sua última conquista, mas também a que o levou à morte.
O filme conta a história da última parte da viagem de Gabriel, seus encontros, o que viveu. Foi um trabalho primoroso de reconstrução desse período. Foi filmado nos locais em que esteve, e tirando os dois protagonistas – Gabriel e a namorada), os demais participantes são as pessoas reais com que conviveu, que, além de reconstruir no filme os encontros que tiveram com ele, ainda deram depoimentos emocionantes sobre esses momentos e sobre o rapaz.
A cena inicial do filme já revela o seu final. Uma sequência bela ampla, começa com as paisagens, os campos, o trabalho de extração manual, até que mostra o momento em que os trabalhadores encontraram o corpo sem vida de Gabriel, para eles inesperado, já que estavam num local muito distinto daquele onde estavam sendo feitas as buscas. Volta alguns meses e segue contando sua história, até o momento em que retorna ao lugar onde começou, retratando os últimos momentos de sua vida.
De suas interações com as montanhas, tiramos algumas lições, que podem nos ajudar a nos manter vivos, íntegros diante de dificuldades semelhantes às que ele encontrou.
É importante utilizar, sempre, os equipamentos necessários. Esse ponto não é negociável. A falta desses recursos pode causar danos graves, e permanentes. Vemos que na subida do monte Kilimanjaro Gabriel dispensa os óculos, o que lhe custou uma cegueira temporária na descida, e colocou em risco também o guia, que abdicou dos seus próprios óculos para dá-los a ele, concordando assim em compartilhar esse risco. Já no monte Mulange, Gabriel optou por não usar botas, subir de bermuda e camiseta. Também não levou comida ou água suficiente para a expedição. Embora a subida parecesse ser rápida e não tão complicada como algumas que já havia feito, o tempo virou rapidamente, o que é comum em regiões de grande altura, e Gabriel foi vencido pelo frio e pela falta de alimentação.
Deve-se levar em consideração, ainda, que ele ia ao lugar pela primeira vez, e ainda assim dispensou o guia que o acompanhava. Essa decisão foi crucial para o fim que o acometeu. Depois de subir ao pico, com a virada do tempo, uma grande neblina tomou o local, e Gabriel não foi capaz de encontrar a trilha de volta, tendo vagado buscando o caminho, tempo em que eram consumidos seus recursos, suas forças, e que o frio lhe venceu.
É importante, também, observar os sinais do tempo. As fotos de Gabriel no pico já mostram os sinais claros da tormenta que se abateu sobre o lugar. A neblina estava presente. Ao menor sinal de perigo, devemos nos precaver, e não deixar de ter até mesmo o desprendimento de desistir, quando necessário, diante de situações que podem nos vencer, sobretudo quando não estamos suficientemente preparados. É um ato de coragem lugar contra os seus limites e superar desafios com força e vontade, mas é sábio desistir, quando necessário, e recomeçar em condições mais favoráveis.
Por fim, é fundamental que nos mantenhamos sempre humildes diante da natureza. A experiência que temos não pode nos tornar excessivamente seguros. Cada lugar tem suas próprias características, seus desafios. Nunca podemos pensar que experiências anteriores, por mais intensas que tenham sido, nos preparam para tudo o que virá.
Essa é uma história bonita e repleta de lições. Gabriel sem dúvida deixou uma marca no mundo, que segue nos inspirando e ensinando. Que Deus o tenha em bom lugar, que a família encontre consolo e a alegria de ter convivido com alguém tão especial, e que a natureza honre esse ser humano que entregou sua vida nessa conexão profunda e sagrada.