Com os pés descalços

Quando fiz a minha primeira travessia, pelos Lençóis Maranhenses, pensei muito em como fazer, que equipamentos usar, qual a roupa adequada. Uma preocupação sempre presente por quem escolhe caminhar são os melhores sapatos para usar durante o trajeto. E eu não fui exceção. Pensei, testei, avaliei, e por fim escolhi o que para mim foi a melhor opção, e uma grande alegria: fazer a travessia descalça. 

Deixei para dizer isso hoje porque sei que essa escolha teve muito a ver com minhas memórias da infância. A pessoa que fazia a travessia era a mesma criança que andava descalça pela praia, por longos quilômetros, que sempre deixou os sapatos para brincar na grama, na terra, nos pilotis do prédio. Que os largava na porta de casa assim que chegava dos compromissos sociais. Continuei fazendo isso depois de adulta, e faço até hoje. Em minha estreia como peregrina não poderia ser diferente. 

Fazer a travessia descalça foi estar em verdadeira comunhão com o lugar que via e vivia, com a natureza que me acolhia e deslumbrava, e ter com ela uma experiência ainda mais profunda. Eu me misturei com essa natureza, a areia subia nos meus pés, entrava pelos meus dedos, em comunhão comigo. 

Os pés na areia se somavam ao olhar também infantil, de deslumbre a cada instante, a cada passo, nos pés ou no topo de cada duna, na visão das lagoas, do sol, das nuvens em formatos diferentes ou engraçados, no arco íris, nos espetaculares pores do sol, nos animais que viviam, se alimentavam e bebiam água por ali, nos saudando ou nos estranhando. A cada passo, uma emoção nova, a certeza de estar vivendo momentos especiais e inesquecíveis.  A cada dia, a imensa gratidão por estar ali. E estava inteira, com toda a minha atenção, e a minha emoção, voltadas para o que eu fazia, para cada passo, cada paisagem. Como a criança que eu, adulta, reaprendi a ser. 

Não vai ser sempre assim, sem pode ser! Fiz outras travessias usando tênis, bota, papete e outros calçados adequados para o lugar que íamos, sempre com a orientação de pessoas mais experientes, o que tem sido muito importante. Mas, com certeza, foi o melhor começo possível. Que venham as próximas caminhadas, sempre com os pés no chão (com o calçado apropriado) e os olhos atentos no caminho!!

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