Quando assisti o filme “Cartas para Julieta”, uma deliciosa comédia romântica, perfeita para preencher uma tarde de domingo, algo me chamou a atenção, como eu imagino que tenha acontecido com a maioria dos espectadores do filme: a carta que Sophie escreveu para Claire, lida na cena de seu casamento com Lorenzo. Acredito sinceramente que muitas pessoas, assim como Claire, ao tomar conhecimento do conteúdo daquela carta, buscaram reconciliar-se com o seu passado, com pessoas ou experiências que gostariam de ter vivido, mas não tiveram oportunidade ou coragem.
Como diz a carta, as palavras “e se” são poderosas, e nos abrem um mundo de possibilidades. E se eu tivesse dito o que pensava naquela ocasião? E se eu tivesse me calado quando falei algo que (acredito) não deveria? Se eu tivesse agido, ou deixado de agir? Se eu tivesse ido, ficado, abraçado, beijado, gritado ou simplesmente silenciado? O que poderia ser diferente?
A angústia quanto às possibilidades de futuro fez com que o ser humano fosse além e desenvolvesse o conhecimento dos multiversos e das realidades paralelas, onde refazemos nossas escolhas e seguimos por caminhos diferentes. Onde estamos casados com aquela pessoa que amamos e que não tivemos tempo ou coragem de seguir, ou abandonamos quem não nos faz bem e seguimos um caminho novo, diferente. Onde tivemos a coragem de largar o emprego seguro e seguir os nossos sonhos, ou fazer aquela viagem que tivemos que adiar indefinidamente e já sabemos que nunca faremos. Seria bom se pudéssemos visitar essas possibilidades, conhecer os resultados desses caminhos, para que pudéssemos refazer nossas escolhas, ou, não sendo isso possível, simplesmente saber que vale a pena correr os riscos que nos levam ao que buscamos, ou simplesmente compreender que não existe um pote de ouro no final desse arco íris.
A língua portuguesa, com sua riqueza e beleza infinitas, nos presenteia com um tempo verbal específico para isso: o futuro do pretérito. Ele fala de um futuro que não aconteceu, mas que poderia ter acontecido. Segundo a gramática, ele se refere a um fato que poderia ter acontecido posteriormente a uma situação passada: eu estaria caminhando na praia hoje se não tivesse escolhido estar aqui. Ela teria 46 hoje se não tivesse morrido. Ele teria uma estabilidade financeira maior se tivesse aceitado aquele cargo que foi oferecido, embora não fosse o emprego de seus sonhos. Eu poderia ter três filhos e uma vida completamente diferente se tivesse aceitado aquele pedido de casamento. SE eu não tivesse saído para pedalar naquele domingo o meu pulso ainda estaria inteiro, e minha vida teria seguido o curso esperado Mas não foi assim que aconteceu. E não será, a não ser numa realidade paralela que não conheceremos.
Eu me lembro que quando assisti o filme, pensei em que decisões eu mudaria em minha vida, no que teria feito diferente, e nos caminhos a que isso poderia ter me conduzido. Cheguei, na época, à conclusão de que não mudaria nada. Que estava onde deveria, e onde gostaria de estar. E me lembrei de uma passagem marcante de um outro filme, esse mais denso e mais impactante, e por isso um de meus prediletos: Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças. Aquela cena em que os dois estão deitados no rio congelado e dizem que estão exatamente onde gostariam de estar me conduz a essa busca pessoal: de estar sempre onde eu quero estar, de estar consciente de minhas escolhas e viver o que escolhi intensamente, sem medos e sem arrependimentos.
Poderia ser diferente? Claro! Mas não é, e não será. O presente é uma dádiva, uma bênção e, sobretudo, uma grande oportunidade. Sejam quais forem os caminhos e as escolhas que nos levaram ao lugar onde estamos, devemos abraçar a convicção de que este é exatamente o lugar onde devemos estar. E que o futuro do presente é mais importante do que o futuro do pretérito, e infinitamente mais poderoso, porque é possível e real. É o que somos e o que seremos. O que podemos viver e transformar. O espaço em que podemos agir. O nosso presente precioso. E que belo presente!